“Deus sabe que não há porque nos envergonharmos de nossas lágrimas jamais, pois elas são a chuva que cai sobre a poeira da terra que nos cega (...)”
“A decadência da Europa nos oferece um espectáculo imenso cujos momentos mais fortes são omitidos ou são dispensados. O próprio da cena em que nos encontramos hoje é representar um teatro; sem monumentos que sejam nossa obra e que nos pertençam, nós vivemos cercados de cenários. Mas há mais: o europeu não sabe quem ele é; ele ignora que raças se misturam nele; ele procura que papel poderia ter; ele não tem individualidade.”
“É bom quando nossa consciência sofre grandes ferimentos, pois isso a torna mais sensível a cada estímulo. Penso que devemos ler apenas livros que nos ferem, que nos afligem. Se o livro que estamos lendo não nos desperta como um soco no crânio, por que perder tempo lendo-o? Para que ele nos torne felizes, como você diz? Oh Deus, nós seríamos felizes do mesmo modo se esses livros não existissem. Livros que nos fazem felizes poderíamos escrever nós mesmos num piscar de olhos. Precisamos de livros que nos atinjam como a mais dolorosa desventura, que nos assolem profundamente – como a morte de alguém que amávamos mais do que a nós mesmos –, que nos façam sentir que fomos banidos para o ermo, para longe de qualquer presença humana – como um suicídio. Um livro deve ser um machado para o mar congelado que há dentro de nós”
“A morte tem que estar tapada, pois só assim a podemos olhar, tapada com muita terra para a esquecermos e voltarmos a acreditar que ela não existe. É preciso esquecê-la, tapá-la com terra, pazadas de terra, ou então com a vida. Sim, a vida. A vida é que nos faz esquecer a morte.”
“Quantas vezes contamos a história da nossa vida? Quantas vezes adaptamos, embelezamos, fazemos cortes matreiros? E, quanto mais a vida avança, menos são os que à nossa volta desafiam o nosso relato, para nos lembrar que a nossa vida não é a nossa vida, é só a história que contámos sobre a nossa vida. Que contámos aos outros mas — principalmente — a nós próprios.”
“Muitas das actividades humanas adquirem o seu significado pelo facto de serem irrepetíveis. Fazemos escolhas, tomamos decisões que dão forma às pessoas em que nos tornamos. A nossa satisfação pela experiência imediata do padrão de luz e sombra numa floresta decorre, em parte, do facto de ser um efeito passageiro que podemos nunca mais voltar a ver. A nossa mortalidade faz-nos dar valor ao presente porque podemos não ter um futuro. O padrão das nossas escolhas e as coisas que nos acontecem dão-nos a nossa história pessoal. Contudo, se viermos a viver para sempre após a morte, esta fonte de significado não está disponível para nós. Haverá sempre tempo para fazer tudo. Bernard Williams (1929-2003) argumentou que uma imortalidade assim seria entediante e, afinal, sem significado. São os facto de haver morte e da sua finalidade que dão às nossas vidas o significado que elas têm.”