“Independência é o luxo de todas aquelas pessoas que são demasiado confiantes e atarefadas e populares e atraentes para serem apenas o simples e batido "sozinhas".”
“Ou talvez simplesmente tenha lido demasiados romances, os alcoólicos são sempre atraentes e divertidos e encantadores e complexos, como o Sebastian Flyte ou o Abe North em 'Terna é a Noite', e bebem por causa de uma tristeza de alma profunda, insaciável, ou por causa do terrível legado da Primeira Guerra Mundial, ao passo que eu me embebedo simplesmente porque tenho sede e gosto do sabor da cerveja e porque sou demasiado patego para saber quando devo parar. Afinal de contas, não posso propriamente pôr a culpa à Guerra das Malvinas.”
“É preciso perder o hábito e deixar de conceber a cultura como saber enciclopédico, no qual o homem é visto apenas sob a forma de um recipiente a encher e entupir de dados empíricos, de fatos brutos e desconexos, que ele depois deverá classificar em seu cérebro como nas colunas de um dicionário, para poder em seguida, em cada ocasião concreta, responder aos vários estímulos do mundo exterior. Essa forma de cultura é realmente prejudicial, sobretudo para o proletariado. Serve apenas para criar marginais, pessoas que acreditam ser superiores ao resto da humanidade porque acumularam na memória certo número de dados e de datas que vomitam a cada ocasião, criando assim quase que uma barreira entre elas e as demais pessoas. Serve para criar aquele tipo de intelectualismo balofo e incolor, tão bem-fustigado duramente por Romain Rolland, intelectualismo que gerou toda uma caterva de presunçosos e sabichões, mais deletérios para a vida social do que os micróbios da tuberculose e da sífilis o são para a beleza e a saúde física dos corpos.”
“"Ter medo de errar é um erro. É sempre um erro. E é o único erro que não tem perdão. Sou maravilhado por quem erra. Por quem sabe que, por fazer, por tentar, pode errar. E são as melhores pessoas, convence-te disso, quem mais erra. São as pessoas que vão aos limites (e os ultrapassam sempre que lá chegam), que se testam como se não houvesse amanhã, como se o agora fosse tudo o que há para haver. E é: o agora é tudo o que há para haver.”
“«Andar a pé por uma cidade antiquíssima, como Lisboa, é meio-caminho andado para se sentir uma tristeza profunda pela efemeridade do nosso próprio mundo: onde estão os nossos sítios, os nossos mortos, esses pontos de contacto entre o nosso coração e o território? Como continuar a caminhar, quando grande parte do que amámos já se foi embora? Quem estuda a história não se pode dar ao luxo de ser nostálgico, mas eu não sou historiador, sou escritor e por isso posso ser nostálgico à vontade. E nem toda a tristeza é má. Continuam perto de nós, essas âncoras de osso e pedra, de palavra e memória - camufladas no território, como um vasto sistema nervoso sob os músculos. Continua-se a caminhar, porque o território é tudo o que existe: é tudo o que sempre existiu e continuará a existir; mesmo depois das mortes daqueles de quem gostamos e da ruína dos locais onde vivemos. Somos sílabas e iluminuras num texto redigido pelo tempo sobre a terra que nos viu nascer, como tinta sobre um pedaço de papel. Nós secamos, como a tinta - embaciamos. O território fica - mas nós ficamos nele. Ressequidos. Translúcidos. Como folhas mortas. Não há nada mais para além disso.»”
“Manhãs de escala são um momento especial para o semiagorafóbico, porque quase todo mundo deixa o navio e vai para a terra firme participar de Passeios Organizados ou fazer turismo peripatético espontâneo e os conveses superiores da e.m. Nadir assumem a mesma qualidade fantasmagórica e misteriosa da sua casa quando você é criança, adoece e fica em casa quando todo mundo saiu para o trabalho ou a escola etc.”
“Toda a arte é agressiva, Isabella. E toda a vida de artista é uma pequena ou uma grande guerra, a começar pelo próprio e pelas suas limitações. Para chegar a alguma coisa que te proponhas é preciso primeiro a ambição e depois o talento, o conhecimento e, por fim, a oportunidade.”