“mesmos o que nossa inteligência rejeitara, por julgá-lo a última reserva do passado, a melhor, aquela que, quando todas as nossas lágrimas parecem ter secado, sabe nos fazer chorar ainda. Fora de nós? Erre para melhor dizer, mas escondida a nossos próprios olhares, num esquecimento mais ou menos prolongado. É somente graças a tal esquecimento que pode de vez em quando, reencontrar o ser que já fomos, colocar-nos face a face àquela como o era essa criatura, sofrer de novo, porque não somos mais nós mas ele, e é quem amava a pessoa que agora nos é indiferente.”
“Cada um de nós tem dentro de si alguma coisa que não pode ser negada, ainda que nos faça grita, gritar, até ao fim. Somos o que somos, e pronto. Como a velha lenda celta do pássaro com o espinho no peito que canta até morrer, porque precisa de fazê-lo, porque é levado a isso. Podemos saber que vamos errar até antes de cometermos o erro, mas o conhecimento de nós mesmos não afecta nem altera o resultado. Cada qual entoa o seu cântico, convencido de que é o mais maravilhoso que o mundo já ouviu. Não vês? Criámos os nossos espinhos e nunca nos detivemos para avaliar o custo. A única coisa que podemos fazer é sofrer a dor e dizer intimamente que valeu a pena.”
“Como é que sabes que era amor?Bem, sabe-se que é amor quando tudo o que nos apetece fazer é estar com a outra pessoa, e sabemos mais ou menos que a outra pessoa sente o mesmo.”
“A decadência da Europa nos oferece um espectáculo imenso cujos momentos mais fortes são omitidos ou são dispensados. O próprio da cena em que nos encontramos hoje é representar um teatro; sem monumentos que sejam nossa obra e que nos pertençam, nós vivemos cercados de cenários. Mas há mais: o europeu não sabe quem ele é; ele ignora que raças se misturam nele; ele procura que papel poderia ter; ele não tem individualidade.”
“É bom quando nossa consciência sofre grandes ferimentos, pois isso a torna mais sensível a cada estímulo. Penso que devemos ler apenas livros que nos ferem, que nos afligem. Se o livro que estamos lendo não nos desperta como um soco no crânio, por que perder tempo lendo-o? Para que ele nos torne felizes, como você diz? Oh Deus, nós seríamos felizes do mesmo modo se esses livros não existissem. Livros que nos fazem felizes poderíamos escrever nós mesmos num piscar de olhos. Precisamos de livros que nos atinjam como a mais dolorosa desventura, que nos assolem profundamente – como a morte de alguém que amávamos mais do que a nós mesmos –, que nos façam sentir que fomos banidos para o ermo, para longe de qualquer presença humana – como um suicídio. Um livro deve ser um machado para o mar congelado que há dentro de nós”
“Ele me revelou um lado melhor do meu ser. Quer dizer, não falo apenas do talento para literatura. Refiro-me principalmente à sensibilidade, à liberdade para sentir intensamente e não ter mais vergonha disso. Falo de chorar quando a vontade vem, de fazer um gesto de carinho quando isso é tudo o que importa. Falo de ser humano quando isso significa conhecer nossos defeitos e limites, cientes de que nós somos sempre capazes de nos aprimorar, capazes de aprender a ser mais gente!”