“E assim prosseguimos com as nossas vidas, cada um para seu lado. Por mais profunda e fatal que seja a perda, por mais importante que seja aquilo que a vida nos roubou – arrebatando-o das nossas mãos -, e ainda que nos tenhamos convertido em pessoas completamente diferentes, conservando apenas a mesma fina camada exterior de pele, apesar de tudo isso continuamos a viver as nossas vidas, assim, em silêncio, estendendo a mão para chegar ao fio dos dias que nos coube em sorte, para logo o deixarmos irremediavelmente para trás. Repetindo, muitas vezes, de forma particularmente hábil, o trabalho de todos os dias, deixando na nossa esteira um sentimento de um incomensurável vazio.”
“Muitas das actividades humanas adquirem o seu significado pelo facto de serem irrepetíveis. Fazemos escolhas, tomamos decisões que dão forma às pessoas em que nos tornamos. A nossa satisfação pela experiência imediata do padrão de luz e sombra numa floresta decorre, em parte, do facto de ser um efeito passageiro que podemos nunca mais voltar a ver. A nossa mortalidade faz-nos dar valor ao presente porque podemos não ter um futuro. O padrão das nossas escolhas e as coisas que nos acontecem dão-nos a nossa história pessoal. Contudo, se viermos a viver para sempre após a morte, esta fonte de significado não está disponível para nós. Haverá sempre tempo para fazer tudo. Bernard Williams (1929-2003) argumentou que uma imortalidade assim seria entediante e, afinal, sem significado. São os facto de haver morte e da sua finalidade que dão às nossas vidas o significado que elas têm.”
“(...) pensou na impermanência da vida, na transitoriedade das coisas, na efemeridade do ser; diante dele, a existência fluía como um sopro, sempre em mutação, tudo muda a todo o instante e nada jamais volta a ser o mesmo. Não há finais felizes, reflectiu de si para si. Todos temos um sétimo selo para quebrar, um destino à nossa espera, um apocalipse no fim da linha. Por mais êxitos que somemos, por mais triunfos que alcancemos, por mais conquistas que façamos, para a última estação está-nos sempre reservada uma derrota. Se tivermos sorte e nos esforçarmos por isso, a vida até pode correr bem e ser uma incrível sucessão de momentos felizes, mas no fim, faça-se o que se fizer, tente-se o que se tentar, diga-se o que se disser, aguarda-nos sempre uma derrota, a mais final e absoluta de todas....”
“E pergunto-me a mim mesma se a eternidade será isto, recordar uma e outra vez, um vestido, um beijo, um dia de Outono, a primeira neve, os meus cães. As coisas essenciais. O nome das rosas e as frases dos livros, o tempo em que alguém nos amou, o jardim que fizemos com as nossas mãos”
“Somos todos mais místicos do que acreditamos ou queremos crer (...). Temos visto mais do que deixamos transparecer, até para nós mesmos. Seja em momentos de beleza ou dor, seja por meio de alguma reviravolta sutil em nossa vida, ao menos vislumbramos o que cegou os santos; só que, ao contrário dos santos, seguimos em frente como se nada tivesse acontecido. Seguir em frente ciente de que algo aconteceu, apesar de não ter certeza do que foi, nem do que fazer com o que ocorreu, é entrar na dimensão da vida de que trata a palavra religião.”
“A única coisa de que dispomos, para acreditar, são os nossos sentidos, as ferramentas que utilizamos para apreender o mundo: a nossa vista, o nosso tacto, a nossa memória. Se os nossos sentidos nos mentirem, então não podemos confiar em nada. E mesmo que não acreditemos, ainda assim não podemos seguir por nenhum outro caminho além daquele que os nossos sentidos nos mostram; e esse caminho, temos de o percorrer até o fim.”