“sabe, Hillé, às vezes penso que fomos pai e filha, mãe e filho, irmão irmã, que houve lutas e nós, e fios de sangue, que eu tinha fome de ti, que eu te matei, que saía de tuas narinas um cheiro de noite dor incesto e violência, que eras velha e moça e menina, que uns guizos em mim se batiam estridentes cada vez que eu te olhava, que havias sido minha desde sempre, barro e vasilha, espelho e amplidão, infinitas vezes nós dois em flashes nítidos rapidíssimos, recortados em ouro, em negro, numa lua esvaída sombra e sépia, nós dois muito claros num parapeito de pedra cor de terra”

Hilda Hilst

Hilda Hilst - “sabe, Hillé, às vezes penso que fomos pai...” 1

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“Tu inspiraste Rowling, e foi nas terras de Morpheus que se moldou Hogwarts. Tu inspiraste Tolkien, e foi nas terras de Phantasos que se anexaram as extensões de Terra-Média. Tu inspiraste Lovecraft e em minhas terras se fixou Miskatonic. Então eu te pergunto com sinceridade, anjo: até onde vai tua vontade de ser coadjuvante em um mundo de formas e pensamentos?”

Raphael Draccon
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“Pensas que sabes o que é sofrer, mas não sabes. Tu sabes o que é perda. Tiveste quem te amasse e perdeste-os. Eu só tenho um pai que me quer matar desde o instante em que soube da minha existência e passou décadas a demonstrar-me o quanto o queria. Uma mãe cujo o único interesse era vangloriar-se sobre o fracasso dele em vez de o tentar evitar. E a única coisa comum aos dois, é que o passatempo preferido deles é a caça, e a cabeça a prémio é a minha! - Danton”

L.C. Lavado
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“Existem momentos em que somos sociais, disponíveis; e existem momentos em que somos individuais. No café detestam que eu leve livros e os leia, e que escreva. Aceitam e gostam de alguém que leva um jornal e lê durante horas, sentado. É uma questão de não se sentirem estúpidos, mas são estúpidos.”

Gonçalo M. Tavares
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“Ah, lei ladra, o poder da vida. Direitinho declaro o que, durando todo tempo, sempre mais, às vezes menos, comigo se passou. Aquela mandante amizade. Eu não pensava em adiação nenhuma, de pior propósito. Mas eu gostava de, dia mais dia, mais gostava. Diga o senhor: como um feitiço? Isso. Feito coisa-feita. Era ele estar perto de mim, e nada me faltava. Era ele fechar a cara e estar tristonho, e eu perdia meu sossego. Era ele estar por longe, e eu só nele pensava. E eu mesmo não entendia então o que aquilo era? Sei que sim. Mas não. E eu mesmo entender não queria. Acho que. Aquela meiguice, desigual que ele sabia esconder o mais de sempre. E em mim a vontade de chegar todo próximo, quase uma ânsia de sentir o cheiro do corpo dele, dos braços, que às vezes adivinhei insensatamente - tentação dessa eu espairecia, aí rijo comigo renegava. Muitos momentos. Conforme, por exemplo, quando eu me lembrava daquelas mãos, do jeito como se encostavam em meu rosto, quando ele cortou meu cabelo. Sempre.”

Guimarães Rosa
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“«Sabe, meu amor, que te amo. E que te amarei até morrer. É por isso que todo o resto me parece tão pouco, um nada imenso de nenhum valor. Sabe que te choro e te venero, e sobretudo que te espero. E sabe que te vejo, com olhos de quem vê, e que te conheço, como só conhece um livro quem o lê. Sabe que à amargura dos dias subtraí a doçura de te ter. Sim, o cintilar da vida, ao meu redor, por te ter. Por saber-te nunca muito longe, embora raramente aqui. por saber que, nos teus olhos - laivos de mel e coisas mais profundas, lucidez e racionalidade - leio que também me lês. Deslizemos agora para o silêncio, perfeição. Não vejo já necessidade de prender a tua mão, pois que sinto que te prendi. Ao teu olhar, que se enreda no meu. que estranhas asas povoam as minhas entranhas, murmuram a meus ouvidos. que grande és, que tola sou. Sabe, meu amor, que tenho plena consciência das nossas dimensões. Basta-me ter-te assim, como te tenho, para seguir pela vida a sorrir. Em mim não se apagarão mais luzes, em mim, à noite, acendem-se as estrelas. Fosse eu firmamento, e tu o cimento com que se constrói o mundo. Sem nós, nada. Reservatório de tudo. Conheço-te, milagre maior, e tenho-te, não podia ter-te melhor. Porque caminhas a meu lado, não acorrentado a mim. Porque me beijas a testa e porque te louvo as mãos. Homem honesto. Amor maior. Porque me guias na escuridão das ingenuidades - resquícios da infância - e porque não me apontas caminhos, descreves-me paisagens. Sim e não, talvez e também. Veremos o que dali vem. E eu, a teu lado, que tola sou, pequena e feliz, que feliz é quem amou assim um grande amor. Ecos de palavras, distantes. Que importa se não somos amantes? Se nunca o seremos? Sei que te amo e, nalguma linguagem, sei que me amas também. Se é na matemática dos racionais, se na pureza dos amigos, se no secretismo dos poetas, isso não sei. Sei que te carrego em mim e que, se fechar os olhos, me sorris. Estás comigo a todo o instante. Não te guardo em caixas, fotografias ou objectos. Caberias lá tu em caixas, mundo, permanecerias lá tu imóvel, como os objectos, vida. Quanto muito, vejo-te às vezes num livro cá por casa. Mas sei-te, e sei-te quase de cor. Não quero saber-te, na totalidade ou de cor. Não o poderia, é inalcançável. Tão grande és tu, que não acabas. Em mim nunca acabarás. A felicidade que a tua volta me trouxe. E sabe que vou chorar, «a cada ausência tua eu vou chorar». Mas não lágrimas; é paixão, fogo, urgência. Coisa física, átomos de energia em colisão. Ainda assim, ter-te-ei aqui, para seguir pela vida a sorrir. A cada vez que afastar os lençóis, pedir-te-ei que te chegues para lá. E ainda que a tua boca nunca sobre a minha pouse, e ainda que nunca venhas a sorrir enquanto te beijo, sabe, meu amor, que te amo, e que te amarei até morrer. Com a certeza de quem quer viver, de quem quer seguir, a vida inteira, com a alma enredada na tua. Que o teu chá seja fervido da minha chaleira, e que os teus livros disputem com os meus o espaço da prateleira. Meu amor, sabe que te amarei a vida inteira.»”

Célia Correia Loureiro
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