“A universidade moderna confere o privilégio de discordar apenas aos que foram testados e classificados como potenciais homens de dinheiro ou detentores de poder. Ninguém recebe um centavo dos fundos fiscais para formar-se nas horas vagas ou para educar outros, a não ser que possa comprová-lo com um certificado. As escolas escolhem para os estágios seguintes aqueles que, nos primeiros estágios do jogo, provaram ser bons investimentos para a ordem estabelecida.”
“Os bons e os maus resultados dos nossos ditos e obras vão-se distribuindo, supõe-se que de uma forma bastante uniforme e equilibrada, por todos os dias do futuro, incluindo aqueles infindáveis, em que já cá não estaremos para poder comprová-lo, para congratular-nos ou pedir perdão, aliás, há que diga que isso é que é a imortalidade.”
“Perante o seu momentâneo desânimo, a mãe encheu uma panela com água e deu-lhe nove ocos. Disse: «Põe os ovos, um a um, dentro de água, com cuidado para não se partirem. Os que forem ao fundo, estão bons, os que vierem acima, estão estragados.Duarte perguntou se não deveria ser ao contrário: os maus irem ao fundo e os bons nadarem.A mãe riu-se: «Não, os bons vão ao fundo.»”
“Quem investe apenas nos jovens que lhe dão retorno não é digno de ser chamado de educador. Um excelente educador abraça os alienados, atrai os que o decepcionaram, cativa os rebeldes, aposta nos que erram frequentemente, dá o melhor de si para aqueles em que ninguém acedita. Perdas sempre nos acompanharão; o que nos diferencia dos animais é o que fazemos com elas.”
“Para uma irlandesa, os Kreder eram um casal avarento e porco. Não tinha a imundície franca, instintiva, combativa, enlameada e maltrapilha que Mary conhecia e podia perdoar e amar. A deles era a imundície alemã da economia, de ser desleixado com o que vestia para poupar as roupas, de economizar nos banhos, de deixar o cabelo oleoso para poupar sabonete e toalhas, de ter as roupas sujas não por opção, as porque era mais barato, de manter a casa fechada e abafada para não gastar com aquecimento, de viver miseravelmente não apenas para economizar dinheiro, mas até para esquecer que o possuíam, trabalhando sem parar não só porque era de sua natureza ou porque precisavam disso, mas porque lhes trazia dinheiro e porque assim evitavam as situações em que podiam gastá-lo.”
“Onde terá ficado aquela criança que apenas conhece da fotografia e cuja memória há muito se perdeu na sedimentação dos dias? Não se recorda quando se separaram. Quando um deixou de ser o outro. Onde está nele aquela criança? O homem que é hoje é o resultado de todos os dias daquela criança? E se os dias tivessem sido outros, seria outro homem? Se ele pudesse apagar alguns dias, seriam todos os outros suficientes para para ele ser quem hoje é? Apagar alguns dias. Apagar um dia, que fosse aquele dia. Será o homem apenas o conjunto das suas memórias ou será antes a soma de todos os seus esquecimentos?”