“ (…) Senti saudades, não do passado, mas dum futuro qualquer, tão longe, tão lá no fundo, tão sonho, tecido apenas de pequenas coisas doces, num mundo menos pesado de cadáveres, sem outro heroísmo que não fosse o de vivermos teimosamente todos os dias e, sobretudo, sem a horrível morte colectiva a substituir a boa, a individual, a sagrada morte de cada um. (…)Assim cogitei toda a tarde, no oitavo dia do mês de Maio de mil novecentos e quarenta e cinco, data em que findou a segunda guerra mundial, no meio de vivas e de bandeiras de triunfo, e em que tentei, em vão, resignar-me ao mundo dos outros e às montras de enchidos de porco, - sem estrelas reflectidas nos vidros.”

José Gomes Ferreira

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“O Crisóstomo disse ao Camilo: todos nascemos filhos de mil pais e de mais mil mães, e a solidão é sobretudo a incapacidade de ver qualquer pessoa como nos pertencendo, para que nos pertença de verdade e se gere um cuidado mútuo. Como se os nossos mil pais e mais as nossas mil mães coincidissem em parte, como se fôssemos por aí irmãos, irmãos uns dos outros. Somos o resultado de tanta gente, de tanta história, tão grandes sonhos que vão passando de pessoa a pessoa, que nunca estaremos sós.”


“oh, a medonha coragem dos que vão arrancando de si, dia a dia, a doçura da saudade do que passou, o encanto novo da esperança do que há-de vir, e que serenamente, desdenhosamente, sem saudades nem esperanças, partem um dia sem saber para onde, aventureiros da morte, emigrantes sem eira nem beira, audaciosos esquadrinhadores de abismos mais negros e mais misteriosos que todos os abismos escancarados do mundo”


“Dormiu sem o saber, mas sabendo que continuava viva no sono, que lhe sobrava metade da cama e que estava deitada de costas do lado esquerdo, como sempre, mas que lhe fazia falta o contrapeso do outro corpo no outro lado. Pensando em sonhos, pensou que nunca mais poderia dormir assim e, em sonhos, começou a soluçar sem mudar de posição no seu lado, até muito depois de terem acabado de cantar os galos, e acordou-a o sol indesejável da manhã sem ele.”


“Uma noite fiquei a dormir na tua cama, disse. Entendamo-nos, este homem é oleiro, trabalhador manual portanto, sem finezas de formação intelectual e artística tirando as necessárias ao exercício da sua profissão, de uma idade já mais do que madura, criou-se num tempo em que o mais corrente era terem as pessoas de sofrer, cada uma em si mesma e todas em toda a gente, as expressões do sentimento e as ansiedades do corpo, e se é certo que não seriam muitos os que no seu meio social e cultural poderiam pôr-lhe um pé adiante em matéria de sensibilidade e de inteligência, ouvir dizer assim de supetão, da boca de uma mulher com quem nunca jazera em intimidade, que dormiu, ela, na sua cama dele, por muito energicamente que estivesse a andar em direcção à casa onde o equívoco caso se produziu, por força haveria de suspender o passo, olhar com pasmo a ousada criatura, os homens, confessemo-lo de uma vez, nunca acabarão de entender as mulheres, felizmente que este conseguiu, sem saber bem como, descobrir no meio da sua confusão as palavras exactas que a ocasião pedia, Nunca mais dormirás noutra.”


“Ler é acumular conhecimento. Mas não apenas isso. Ler nos oferece todo dia o que a religião nos promete para um futuro póstumo e improvável: a possibilidade de vivermos mais do que nosso tempo de vida nos permite fazê-lo.”


“Claro que estamos em guerra, e é guerra de sítio, cada um de nós cerca o outro e é cercado por ele, queremos deitar abaixo os muros do outro e continuar com os nossos, o amor será não haver mais barreiras, o amor é o fim do cerco.”