“É um pouco assim: há linhas de ar em volta da sua cabeça, do seu olhar, zonas de detenção dos seus olhos, do seu olfato, do seu paladar, ou seja, você anda com seu limite por forae você não poderá ultrapassar esse limite quando pensar que já apreendeu plenamente qualquer coisa, a coisa que é igual a um iceberg, tem um pedacinho por fora e o mostra, com todo o resto do seu volume bem para lá do seu limite e foi assim que o Titanic afundou. Heste Holiveira sempre com os seus hexemplos. (SIC)”

Julio Cortazar

Julio Cortázar - “É um pouco assim: há linhas de ar em...” 1

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“Sempre desprezei as coisas mornas, as coisas que não provocam ódio nem paixão, as coisas definidas como mais ou menos, um filme mais ou menos ,um livro mais ou menos.Tudo perda de tempo.Viver tem que ser perturbador, é preciso que nossos anjos e demônios sejam despertados, e com eles sua raiva, seu orgulho, seu asco, sua adoraçao ou seu desprezo.O que não faz você mover um músculo, o que não faz você estremecer, suar, desatinar, não merece fazer parte da sua biografia.”

Martha Medeiros
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“Você, Lord Byron, é inteligente também, mas uma inteligência fina, penetrante, como aço, como uma espada. Ao contrário de mim, você é mais capaz de se fazer amado do que de amar. Sua lógica é irresistível, mas impiedosa, irritante. É desses remédios que matam a doença e o doente. Você tem sentimento poético, e muito — no entanto é incapaz de escrever um verso que preste. Por quê? Sei lá. Há qualquer coisa que te contém, que te segura, como uma mão. Sua compreensão do mundo, da vida e das coisas é surpreendente, seu olho clínico é infalível, mas você é um homem refreado, bem comportado, bem educado, flor do asfalto, lírio de salão, um príncipe, o nosso Príncipe de Gales, como diz o Hugo. Tem uma aura de pureza não conspurcada, mas é ascético demais, aprimorado demais, debilitado por excesso de tratamento. Não se contamina nunca, e isso humilha a todo mundo. É esportivo, é atlético, é saudável, prevenido contra todas as doenças, mas, um dia, não vai resistir a um simples resfriado: há de cair de cama e afinal descobrir que para o vírus da gripe ainda não existe antibiótico. — Opinião de estudante de Medicina — e Eduardo pro- curava ocultar seu ressentimento com um sorriso. — Você, agora.(...)— E você, Eduardo. Você, o puro, o intocado, o que se preserva, como disse Mauro. Seu horror ao compromisso porque você se julga um comprometido, tem uma missão a cumprir, é um escritor. Você e sua simpatia, sua saúde... Bem sucedido em tudo, mas cheio de arestas que ferem sem querer. Seu ar de quem está sempre indo a um lugar que não é aqui, para se encontrar com alguém que não somos nós. Seu desprezo pelos fracos porque se julga forte, sua inteligência incômoda, sua explicação para tudo, seu senso prático — tudo orgulho. O orgulho de ser o primeiro — a vida, para você, é um campeonato de natação. Sua desenvoltura, sua excitação mental, sua fidelidade a um destino certo, tudo isso faz de você presa certa do demônio — mesmo sua vocação para o ascetismo, para a vida áspera, espartana. Você e seus escritores ingleses, você e sua chave que abre todas as portas. Orgulho: você e seu orgulho. De nós três, o de mais sorte, o escolhido, nosso amparo, nossa esperança. E de nós três, talvez, o mais miserável, talvez o mais desgraçado, porque condenado à incapacidade de amar, pelo orgulho, ou à solidão, pela renúncia. Hugo não disse mais nada. E os três, agora, não ousavam levantar a cabeça, para não mostrar que estavam chorando. O garçom veio saber se queriam mais chope, ninguém o atendeu. Alguém soltou uma gargalhada no fundo do bar. Lá fora, na rua, um bonde passou com estrépito.”

Fernando Sabino
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“Nas semanas que precederam sua instalação você viveu principalmente à noite. Você mantém seu ritmo e seus costumes por algum tempo. Já na terceira noite, você leva para lá uma mulher que conheceu vagamente, uma habitué do Moloko. Jamila tem vinte anos. Arrasta-se todas as noites pelas boates. Mora com uma tia, no subúrbio. Está com a gargante inflamada. Às cinco da manhã você lhe oferece sua hospitalidade. Ela preferiria que você a levasse para casa, mas você não tem mais carro. Durante a noite, você acaricia vagamente os seios dela. Ouve um grunhido sonolento. Não acontecerá mais nada. Transar com ela ou zelar por seu sono, tanto faz. Em ambos os casos você vai ter a ilusão de tê-la conhecido. Em todo caso, o álcool já lhe deu todas as satisfações do mundo. Você está com trinta e cinco anos, tem diplomas, um passado sólido, uma família burguesa que ela não tem. Mas ela é uma náufraga como você. Para ela, o fracasso é um dado social insuperável que ela sem dúvida arrastará consigo a vida inteira. Para você, é um abismo luxuoso e provisório.”

Pierre Mérot
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“Se um homem escreve bem só quando está bêbado dir-lhe-ei: embebede-se. E se ele me disser que o seu fígado sofre com isso, respondo: o que é o seu fígado? É uma coisa morta que vive enquanto você vive, e os poemas que escrever vivem sem enquanto.”

Fernando Pessoa
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“Mas, não obstante, eu acrescento que em qualquer pensamento genial ou no novo pensamento humano, ou simplesmente até em qualquer pensamento humano sério, que medra da cabeça de alguém, sempre resta algo que de maneira nenhuma se pode transmitir a outras pessoas, embora voc6e tenha garatujado volumes inteiros e passado trinta e cinco anos interpretando o seu pensamento; sempre restará algo que de maneira alguma desejará sair do seu crânio e permanecerá com você para todo o sempre; e assim você acaba morrendo sem ter transmitido a ninguém talvez o mais importante da sua idéia.”

Fyodor Dostoevsky
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