“Quando Odette deixasse de ser para ele uma criatura sempre ausente, cobiçada, imaginária, quando o sentimento que ele tinha por ela não fosse mais aquela mesma perturbação misteriosa que lhe causava a frase da sonata e sim afeto, reconhecimento, quando se estabelecessem entre ambos relações normais que poriam fim à loucura e à tristeza dele, então sem dúvida os atos da vida de Odette lhe pareceriam si mesmos pouco interessantes.”

Marcel Proust

Marcel Proust - “Quando Odette deixasse de ser para ele...” 1

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“Só se um ser humano a amasse tanto que você importasse mais para ele que pai e mãe. Se ele a amasse de todo o coração e deixasse o padre pôr a mão direita sobre a sua como uma promessa de ser fiel e verdadeiro por toda a eternidade. Nesse caso, a alma dele deslizaria para dentro do seu corpo e você, também, obteria uma parcela da felicidade humana. Ele lhe daria uma alma e, no entanto, conservaria a dele próprio.”

Hans Christian Andersen
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“Ah, lei ladra, o poder da vida. Direitinho declaro o que, durando todo tempo, sempre mais, às vezes menos, comigo se passou. Aquela mandante amizade. Eu não pensava em adiação nenhuma, de pior propósito. Mas eu gostava de, dia mais dia, mais gostava. Diga o senhor: como um feitiço? Isso. Feito coisa-feita. Era ele estar perto de mim, e nada me faltava. Era ele fechar a cara e estar tristonho, e eu perdia meu sossego. Era ele estar por longe, e eu só nele pensava. E eu mesmo não entendia então o que aquilo era? Sei que sim. Mas não. E eu mesmo entender não queria. Acho que. Aquela meiguice, desigual que ele sabia esconder o mais de sempre. E em mim a vontade de chegar todo próximo, quase uma ânsia de sentir o cheiro do corpo dele, dos braços, que às vezes adivinhei insensatamente - tentação dessa eu espairecia, aí rijo comigo renegava. Muitos momentos. Conforme, por exemplo, quando eu me lembrava daquelas mãos, do jeito como se encostavam em meu rosto, quando ele cortou meu cabelo. Sempre.”

Guimarães Rosa
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“Entre as recordações de cada pessoa, há coisas que ela não conta para qualquer um, somente para os amigos. Há também aquelas que ela não conta nem para os amigos, somente para sim mesma, e isso secretamente. Mas, finalmente, há também aquelas que o indivíduo tem medo de revelar até para si mesmo, e um homem respeitável tem tais coisas acumuladas em grande quantidade. E pode ser assim mesmo: quanto mais respeitável ele é, mais coisas desse tipo ele tem acumuladas. Eu, pelo menos, só recentemente tomei coragem para recordar algumas das minhas aventuras passadas, as quais até agora tinha evitado com uma certa inquietação. E agora, quando não só recordei, como até me decidi a escrevê-las, agora exatamente quero tirar a prova: é possível alguém ser inteiramente sincero consigo mesmo e não temer toda a verdade? A propósito: Heine afirma que é quase impossível existirem autobiografias sinceras, porque na certa o ser humano mentirá, falando de si mesmo. Na opinião dele, por exemplo, Rousseau sem dúvida mentiu sobre si mesmo em suas 'Confissões' e fez isso até deliberadamente, por vaidade. Estou convencido de que Heine está certo; entendo perfeitamente como, às vezes, alguém pode confessar uma série de crimes por pura vaidade e percebo até muito bem de que tipo pode ser essa vaidade.”

Fiodor Dostoievski
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“Serenado um pouco, abriu o livro e retomou a leitura. Esqueceu-se de si próprio por completo e bem podia então dizer que morrera. Sonhava no outro, ou melhor, o outro era um sonho que nele se sonhava, uma criatura da sua infinita solidão. Até que despertou com uma terrível pontada no peito. A personagem do livro acabara de lhe dizer de novo: «Devo repetir ao leitor que comigo morrerá.». E desta vez o efeito foi espantoso. O trágico leitor perdeu o conhecimento naquele seu leito de sofrimento espiritual; deixou de sonhar no outro e deixou de sonhar-se a si mesmo. E quando voltou a si, lançou fora o livro, apagou a luz e procurou adormecer, deixar de sonhar. Impossível! De quando em quando tinha de levantar-se para beber água; ocorreu-lhe que bebia no Sena, no espelho. «Estarei louco? - repetia -. Certamente que não, porque quando uma pessoa se pergunta se está louca é porque não está...». Levantou-se, pegou-lhe o fogo na lareira e queimou o livro, voltando em seguida a deitar-se. E conseguiu finalmente adormecer.”

Miguel de Unamuno
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“Ele só teve um momento de frieza, com o Dr. Cottard: vendo-o piscar o olho e sorrir-lhe com um ar ambíguo antes que se tivessem falado (mímica que Cottard chamava de "deixar fluir"), Swann acreditou que o médico o conheci sem dúvida por ter estado com ele em algum lugar de prazer, embora ele mesmo os frequentasse muito pouco, nunca tendo vivido no mundo da farra. Considerando a alusão de mau gosto, sobretudo na presença de Odette, que poderia fazer dele uma ideia falsa, simulou um ar glacial. Mas quando soube que a dama que se encontrava a seu lado era a sra. Cottard, pensou que um marido tão jovem não teria pensado em fazer alusão, diante de sua mulher, a divertimento desse tipo, e deixou de atribuir ao ar cúmplice do médico o significado que temia.”

Marcel Proust
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