“Se Meaume fosse a natureza, teria feito apenas os relâmpagos ou a Lua ou as vagas cheias de espuma do oceano na tormenta embatendo nos rochedos negros da costa. Ou a nudez desvelada por acaso por baixo de um pano. Ou um osso de animal ou um caroço de sílex encontrado na terra.”
“Baltasar Mateus, o Sete-Sóis, está calado, apenas olha fixamente Blimunda, e de cada vez que ela o olha a ele sente um aperto na boca do estômago, porque olhos como estes nunca se viram, claros de cinzento, ou verde, ou azul, que com a luz de fora variam ou o pensamento de dentro, e às vezes tornam-se negros noturnos ou brancos brilhantes como lasca de carvão de pedra.”
“Bom ou mau, aquilo que sai da Paris é Paris, seja uma carta, um pedaço de pão, um par de sapatos ou um poema.”
“Eu comi ou não um pedaço de bolo? Degusto outro por precaução.”
“Nada mudou. Afastada das sombras irreais da noite, ressurge a vida, na sua realidade já conhecida. Devemos retomá-la onde a deixamos e apodera-se de nós o terrível sentimento de continuidade necessária da energia no mesmo círculo monótono de hábitos estereotipados, ou então somos presas de um desejo selvagem de que nossas pálpebras se abram um dia sobre um mundo que tivesse sido refundido nas trevas para o nosso próprio prazer, um mundo onde as coisas apresentariam novas formas e cores, que teria mudado ou que teria outros segredos, um mundo em que o passado ocuparia pouco ou nenhum lugar, em que as lembranças não sobreviveriam sob a forma inconsciente de obrigação ou de pesar, uma vez que a recordação da própria felicidade oferece amarguras, assim como a lembrança do prazer já contém sua dor.”
“por isso ele nunca saberá o quanto o amo: e não por ele ser bonito, Nelly, mas por ele ser mais eu, do que eu própria. Não sei de que são feitas as nossas almas, mas elas são iguais; e a de Linton é tão diferente da minha quanto um raio de lua é diferente de um relâmpago, ou o fogo do gelo.”