“Claro que não sabes (...) E nem sequer queres ver o que está posto na mesa à tua frente. Homens. Se estivesse a chover sopa, estarias lá fora com um garfo.”
“Que não suspeitará da tua perdição mergulhado como agora, a teu lado, na contemplação dessa paisagem interna onde não sabes sequer que lugar ocupas, e nem mesmo se estás nela.”
“Dona Laura, ao ver a casa encher-se de bocas - e pressentido que isso de golpes de Estado era coisa para levar o seu tempo -, apressou-se, de faca e alguidar, em direcção às capoeiras, donde regressou com as duas primeiras vítimas da revolução. E ainda não tinha soado as duas da tarde quando, num exercício ostensivo de poder, como se quisesse deixar bem claro o que quer que estivesse a acontecer no País, ali em casa tudo permanecia na mesma, desligou o rádio e a televisão, abriu as portadas que davam para o jardim e anunciou que a canja estava na mesa.”
“Dar um passo pode ser fruto de uma decisão complexa. Há a possibilidade de seguir para a direita ou para a esquerda, posso continuar em frente ou voltar para trás, desfazer. Cada escolha lançará uma cadeia de resultados. Mal comparado, é como acordar na estação Sèvres-Lecourbe e não ter mapa do metro, nunca ter estado ali, não saber sequer onde se está, não saber sequer o que é o metro. Ter de aprender tudo. Ao fim de um tempo, com sorte, conversando com pedintes cegos, tocadores de concertina, talvez se consiga chegar à conclusão que se quer ir para a estação Ourcq, esse é o lugar onde se poderá ser feliz, mas como encontrar o caminho sem mapa, sem conhecer linhas e ligações? É possível arrastar a vida inteira no metro de Paris e nunca passar por Ourcq. É também possível passar por lá e não reconhecer que é ali que se quer sair.”
“Vampiros é o que está a dar – diz o editor – vampiros e sexo desenfreado para senhoras que já não fazem sexo, nem desenfreado nem com freio. Não podemos errar se fizermos um livro em que senhoras que já não fazem sexo, fazem sexo desenfreado com vampiros; ou se fizermos um livro sobre senhoras que, sendo vampiras, já não fazem sexo e acabam por fazê-lo de forma desenfreada.”
“Um quer ir embora e, ao mesmo tempo, não. O outro quer liberdade, mas a dois.Então um se vai e deita em todas as camas, sofrendo. E o outro mergulha sozinho na dor, sobrevivendo.Diferença de idade não existe. A necessidade secreta de cada um é que destrói ilusões e constrói o que está por vir.”