“Pensou no telecrã, nos ouvidos sempre à escuta. Espiavam as pessoas dia e noite, mas mesmo assim, se se conservasse o sangue-frio, conseguia-se ludibriá-los. Muito clarividentes que fossem, nunca resolveriam o enigma de quais os pensamentos dos outros seres humanos. Talvez não fosse bem assim, depois de uma pessoa lhes cair nas mãos. Ninguém sabia o que se passava dentro do Ministério do Amor, mas dava para adivinhar: torturas, drogas, delicados instrumentos que registavam as reações nervosas do preso, esgotamento gradual pela privação do sono, pelo isolamento e pelos interrogatórios constantes. Factos, em todo o caso, tornava-se inviável ocultá-los. Eles podiam reconstituí-los procedendo a averiguações, ou arrancá-los ao preso com torturas. Mas se o objetivo, em vez de ser continuar vivo, for continuar a ser-se humano, então, bem vistas as coisas, tudo o mais que diferença faria? Eles não podem alterar os sentimentos… aliás, nem nós próprios poderíamos alterá-los, mesmo que quiséssemos. Podiam pôr a nu, com todo o pormenor, quanto houvéramos feito, dito ou pensado; mas o mais fundo do coração, cujo funcionamento até para nós constitui um mistério, há-de ser sempre inexpugnável.”

George Orwell

George Orwell - “Pensou no telecrã, nos ouvidos sempre à...” 1

Similar quotes

“Eles não podem alterar os sentimentos... aliás, nem nós próprios poderíamos alterá-los, mesmo que quiséssemos. Podiam pôr a nu, com todo o pormenor, quanto houvéramos feito, dito ou pensado; mas o mais fundo do coração, cujo funcionamento até para nós constitui um mistério, há-de ser sempre inexpugnável.”

George Orwell
Read more

“Ao relacionar-se com o mundo objetivo, por intermédio de suas faculdades, o mundo exterior torna-se real para o homem, e de fato é só o “amor” que faz o homem verdadeiramente crer na realidade do mundo objetivo a ele extrínseco. Sujeito e objeto não podem ser separados . “O olho transformou-se em olho humano quando seu objeto se converteu em um objeto humano, social, criado pelo homem e a este destinado... Eles [os sentidos] se relacionam com a coisa devido a esta, mas a coisa em si mesma é uma relação humana objetiva para si própria e para o homem, e vice-versa. A necessidade e o gozo perderam, assim, seu caráter egoísta, e a natureza perdeu sua mera utilidade pelo fato de sua utilização ter-se transformado em utilização humana. (Com efeito, só posso relacionar-me de maneira humana com uma coisa quando esta se relaciona de maneira humana com o homem)”Esta última afirmação é quase exatamente a mesma feita no pensamento do budismo Zen, assim como por Goethe. De fato o pensamento de Goethe, Hegel e Marx se acha intimamente ligado ao do Zen. O que há de comum neles é a ideia do homem superar a cisão entre sujeito e objeto; o objeto é um objeto, mas no entanto cessa de ser objeto , e nesta nova abordagem o homeme se funde com o objeto, conquanto ele e o objeto continuem a ser dois. O homem ao relacionar-se humanamente com o mundo objetivo, supera a alienação de si mesmo.”

Erich Fromm
Read more

“Portanto - disse a Srta. Tilney -, a senhorita crê que os historiadores não são felizes ao deixar sua imaginação voar. Eles demonstram possuí-la, mas não conseguem despertar o interesse. Eu gosto de História, e não me importo de aceitar o que é falso junto com o que é verdadeiro. Para descrever os fatos principais, eles buscam informações em registros e em outros livros que são tão confiáveis, creio eu, quanto qualquer coisa que não se passe diante de nossos próprios olhos. E quanto aos pequenos adornos aos quais se refere, são apenas adornos, e gosto deles como tal. Se um discurso for bem escrito, eu o lerei com prazer, não importa quem seja o autor. E leio com mais prazer ainda se tiverem sido produzidos pelo Sr. Hume e pelo Sr. Robertson do que se fossem as palavras genuínas de Caractacus, Júlio Agrícola ou ALfredo, o Grande.”

Jane Austen
Read more

“O que é sensível tem de morrer pelo fogo, qual borboleta frágil da noite. E é por isso, diz Erika Kohut, que estes dois seres doentes à mais alta escala, isto é, Schumann e Schubert, irmanados pela partilha do mesmo prefixo, são os que têm um lugar mais próximo do meu coração dilacerado. Não o Schumann a quem já todos os pensamentos desertaram, mas o Schumann, mesmo mesmo antes disso ter acontecido! Uma unha negra antes disso! Ele já adivinha a deserção do seu espírito, já sofre com isso até aos seus vasos mais capilares, despede-se já da sua vida consciente, embrenhando-se pelos coros dos anjos e dos demónios, segura-se, porém, mais uma última vez, não mais possuidor da sua total consciência. Ainda um perscrutar nostálgico mais, o luto pela perda do bem mais precioso: ele próprio. A fase em que ainda se sabe o que em si próprio se perde, antes de renunciar por completo.”

Elfriede Jelinek
Read more

“(...) pensou na impermanência da vida, na transitoriedade das coisas, na efemeridade do ser; diante dele, a existência fluía como um sopro, sempre em mutação, tudo muda a todo o instante e nada jamais volta a ser o mesmo. Não há finais felizes, reflectiu de si para si. Todos temos um sétimo selo para quebrar, um destino à nossa espera, um apocalipse no fim da linha. Por mais êxitos que somemos, por mais triunfos que alcancemos, por mais conquistas que façamos, para a última estação está-nos sempre reservada uma derrota. Se tivermos sorte e nos esforçarmos por isso, a vida até pode correr bem e ser uma incrível sucessão de momentos felizes, mas no fim, faça-se o que se fizer, tente-se o que se tentar, diga-se o que se disser, aguarda-nos sempre uma derrota, a mais final e absoluta de todas....”

José Rodrigues dos Santos
Read more